Depois de “Abbey Road” o “White Album”, ou mais corretamente, o duplo “The Beatles”, é o meu album preferido. Na verdade os dois, juntamente com St. Pepper, sempre ocuparam as preferências dos fãs dos Beatles. As comemorações do 40º aniversário do lançamento desta obra-prima dos Beatles são acompanhadas pela rendição dos Fab Four pelo Vaticano. O jornal do Vaticano 'absolveu' nesta sexta-feira os Beatles em um longo artigo, no qual elogia o talento musical do grupo e comemora os 40 anos do lançamento do "White Album".
O artigo começa recordando, em tom indulgente, a célebre e controvertida declaração de John Lennon de que "os Beatles são mais famosos de Jesus Cristo".
"Foi uma frase que suscitou profunda indignação, mas que, hoje em dia, soa mais como uma mofa de um jovem da classe operária inglesa empolgado com o sucesso", escreve o jornal vaticano.
Segundo o jornal da Santa Sé, o grupo realizou uma 'revolução branca' com seu "White Album", que classifica que "utopia musical, onde se encontra tudo o contrário de tudo".
"Era um conjunto de canções talvez discutíveis, mas reveladoras de toda uma época", afirma.
"Atualmente os produtos fonográficos são estereotipados, muito distantes da criatividade dos Beatles", lamenta o jornal papal.
Encontrei em um blog de um português algumas notas sobre as faixas do album. Por sinal, o blog é bastante intereressante:
http://ratorecordsblog.blogspot.com/2008/11/it-was-40-years-ago.html
ALGUMAS NOTAS SOBRE AS FAIXAS DO ALBUM:
1.A.1 – BACK IN THE U.S.S.R. (Lennon/McCartney) 2:45Uma das mais avassaladoras aberturas de sempre de um album de rock, feita ao som da aterragem de um avião a jacto. O tema esteve para se chamar “I’m Backing The U.S.S.R.” e é uma homenagem de Paul ao tema “Back In The U.S.A.” de Chuck Berry, que lhe foi sugerida por Mike Love durante a estadia em Rishikesh.
1.A.2 – DEAR PRUDENCE (Lennon/McCartney) 4:00
Canção escrita por John Lennon para Prudence Farrow (a irmã mais nova de Mia Farrow) que no retiro espiritual em Rishikesh teria sido uma das pessoas a levar mais a sério a experiência, a ponto de se trancar dias a fio nos seus aposentos. A sua relutância em conviver com as outras pessoas originou portanto este “convite” de Lennon: «Dear Prudence, won’t you come out to play?». Na verdade parece que a Prudence acedeu finalmente a mostrar-se, acabando por se dar muito bem com os quatro Beatles.
1.A.3 – GLASS ONION (Lennon/McCartney) 2:10Numa época caracterizada por importantes movimentos sócio-culturais, Os Beatles eram considerados quase como profetas desses tempos. E era rara a canção que não era passada a pente fino pelos fans, sempre à procura de simbologias ou mensagens escondidas. Um pouco cansado já de todas essas interpretações, Lennon compôs “Glass Onion” como que uma resposta humorística a todos esses Sherlock Holmes das músicas dos Beatles. Além de citar alguns dos temas mais estranhos já gravados pelo grupo, John introduziu ainda outras frases dúbias para alimentar propositadamente todos esses jogos mentais: «looking through the bent backed tulips», «another clue for you all, the walrus was Paul» ou «trying to make a dove-tail joint» são exemplos dessas pequenas provocações.Originariamente a canção acabava com uma série de efeitos sonoros (que podem ser ouvidos na Antologia 3) mas depois George Martin preferiu acabá-la apenas com um som de cordas.
1.A.4 – OB-LA-DI, OB-LA DA (Lennon/McCartney) 3:10Paul ouviu pela primeira vez esta expressão a um amigo nigeriano chamado Jimmy Scott que lhe explicou o respectivo significado: “Life goes on”. Da expressão à composição de uma canção foi um pequeno passo. Considerada por vezes como um dos primeiros exemplos de “reggae branco”, “Ob-La-Di, Ob-La-Da” esteve para ser lançada em single, como Paul queria. Mas tanto George como John se opuseram, sobretudo este último, que sempre detestou a composição. Diz-se até que a melodia era para soar um pouco mais lenta; mas que, no dia da gravação John, para a “despachar” rapidamente, resolveu acelerar um pouco logo à entrada, quando começou a tocar as teclas do piano. O efeito mais rápido agradou aos outros que acordaram em a gravar dessa maneira. Jimmy Scott chegou a participar nas gravações tocando congas e mais tarde Paul deu-lhe parte dos direitos de autor, só por causa da apropriação da expressão. Como que a comprovar que a razão estava do lado de Paul, a canção foi na altura um enorme sucesso pelo grupo Marmalade que a gravou em single (1º lugar em Inglaterra, a 11 e 18 de Janeiro de 1969).
1.A.5 – WILD HONEY PIE (Lennon/McCartney) 1:02Faixa gravada unicamente por Paul, que toca uma série de guitarras e bateria. Nenhum dos outros Beatles esteve sequer presente. O tema, semi-instrumental, é o texto mais curto e mais repetitivo de toda a obra do quarteto. E só foi incluído no disco porque Pattie Boyd Harrison gostava daquilo e Paul lhe fez a vontade. Onde se prova que até um Beatle não é imune ao sexo fraco (forte)...
1.A.6 – THE CONTINUING STORY OF BUNGALOW BILL
(Lennon/ McCartney) 3:05Canção escrita por Lennon que se inspirou num personagem real, Richard Cooke III, um jovem estudante americano que se encontrava também em Rishikesh. Um dia participou numa caçada ao tigre, acompanhado pela mãe, Nancy, que foi atacada pelo felino. Richard não teve outro remédio senão matar o animal para salvar a vida à progenitora. De regresso ao retiro, o episódio enfureceu o Maharishi que não aceitava que um discípulo seu tivesse cometido tal atrocidade. O sermão foi presenciado por John e Paul e a ideia da canção nasceu. O nome do personagem foi inspirado por Buffalo Bill e pelos bungalows onde os convidados do Maharishi se encontravam alojados. Richard Cooke III foi depois fotógrafo da National Geographic (e pensa-se que nunca mais matou nenhum tigre na vida). Este tema foi o primeiro dos dois únicos temas dos Beatles (o outro foi o “Birthday”) a ter coros femininos (Yoko Ono e Maureen Starkey).
1.A.7 – WHILE MY GUITAR GENTLY WEEPS (Harrison) 4:46Primeira grande contribuição de George Harrison para o “White Album”. A génese da canção é no mínimo curiosa. O livro preferido de George na altura era o “I Ching” (um livro chinês sobre transformações) e, influenciado por ele, resolveu fazer uma pequena experiência: escrever uma composição a partir das primeiras palavras que lesse num livro escolhido ao acaso. Foi à biblioteca da casa dos pais, em Lencashire, pegou num livro, abriu-o e leu – “gently weeps”. E pôs-se a escrever.Depois de várias tentativas para gravar a canção (mais de 40 takes, entre Julho e Setembro), George continuava a não gostar de se ouvir no solo de guitarra, Um dia Eric Clapton deu-lhe boleia de Surrey para Londres e George lembrou-se de pedir ajuda ao amigo. Relutante ao princípio, por achar que ninguém deveria tocar com Os Beatles, Clapton acabou por se deixar convencer. Calmamente, acompanhou George ao estúdio, executou o solo sem grandes alaridos numa guitarra Gibson Les Paul e foi-se embora. E assim nasceu uma obra-prima.
1.A.8 – HAPPINESS IS A WARM GUN (Lennon/McCartney) 2:47
Uma canção em três tempos, resultante da junção de outros tantos temas que Lennon tinha composto na altura e inspirada na capa de uma revista que ele viu nas mãos de George Martin e onde se podia ler: “Happiness is a warm gun in your hand”. Parte dos versos (estranhos mas surpreendentemente apelativos) surgiram depois de uma noitada de LSD que Lennon partilhou com Derek Taylor, Neill Aspinall e Pete Shoton. Anos mais tarde McCartney considerou-a a sua canção preferida de todo o album e Lennon chegou a descrevê-la como a “história do Rock ‘n’ Roll”. Hoje, quarenta anos depois, continua actual e a encantar sucessivas gerações de fans dos Beatles.
.B.1 – MARTHA MY DEAR (Lennon/McCartney) 2:28Apesar de Martha ser o nome da cadela de dois anos que Paul tinha na altura a canção não lhe é dedicada, mas sim a alguém que parece ter sido sempre a musa inspiradora de McCartney. Não era Jane Asher, cuja relação estava a chegar ao fim nem Linda Eastman, com quem Paul já namorava quando o tema foi gravado em Outubro de 68.A composição tem certas reminiscências dos anos 30, de cujos musicais Paul era grande apreciador.
1.B.2 – I’M SO TIRED (Lennon/McCartney) 2:01O título desta canção corresponde efectivamente ao cansaço que John começava a sentir depois de três semanas passadas em Rishikesh, onde diariamente assistia a sessões de grupo com cerca de hora e meia de duração. Esse cansaço era físico mas sobretudo mental. A Academia de meditação proibia o alcool e as drogas e John sentia-lhes cada vez mais a falta, a ponto de começar a ter insónias todas as noites. Depois era Yoko que não lhe saía do pensamento (Cynthia veio a descobrir que o marido se levantava sempre muito cedo para ir ver se tinha alguma mensagem da japonesa). Ou seja, John encontrava-se numa encruzilhada crucial e sentia que tinha de dar um novo sentido à sua vida (o que na verdade veio mesmo a acontecer).
.B.3 – BLACKBIRD (Lennon/McCartney) 2:20
Paul sempre disse que as suas melhores canções eram aquelas que lhe surgiam espontâneamente. “Blackbird” é sem dúvida uma dessas canções: simples, melódica, é uma espécie de “Yesterday” sem secção de cordas. Paul gravou-a sózinho, apenas com uma guitarra acústica, a que posteriormente adicionou uns bongos. Onde se prova, uma vez mais, que a simplicidade é a marca principal do génio.
1.B.4 – PIGGIES (Harrison) 2:04Segunda contribuição de Harrison, este tema é “dedicado” a todos os gananciosos que sempre procuraram ganhar dinheiro à custa dos Beatles (por uma vez a palavra ‘piggies’ não é aqui usada, como usualmente, para designar a polícia). Foi uma das canções invocadas mais tarde por Charles Manson que o teriam inspirado para as carnificinas de Agosto de 69, levadas a cabo em várias residências de Los Angeles, a mais célebre das quais pertencente a Roman Polanski, e onde a sua mulher, Sharon Tate, foi uma das vítimas (encontrava-se grávida na altura). A frase “Death To Pigs” apareceu escrita a sangue nas paredes da divisão onde os crimes foram cometidos.1
.B.5 – ROCKY RACOON (Lennon/McCartney) 3:33
Uma história do Oeste selvagem inventada por Paul: «Quando escrevi esta canção estava sentado, juntamente com John e Donovan, no telhado de um dos bungalows de Rishikesh. Pusémo-nos os três a improvisar e tudo saíu muito facilmente. O título original era para ser Rocky Sassoon, mas depois alterámo-lo para Rocky Racoon que soava melhor, tratando-se de um cowboy a viver em Dakota.»
1.B.6 – DON’T PASS ME BY (Starkey) 3:52Única canção de Ringo em todo o album, escrita cinco anos antes, em 1963. Nessa altura, num programa da BBC, Ringo mencionou-a, tendo inclusivé solicitado publicamente a sua inclusão num album dos Beatles. A “revelação” de que Ringo tinha uma canção só sua foi na altura motivo de risota dos outros Beatles que não levaram aquilo muito a sério. No entanto a canção existia mesmo e foi a estreia de Ringo como autor principal em toda a discografia dos Beatles. Até ali tinha-se limitado a colaborações pontuais, em temas como “A Hard Day’s Night”, “Eight Days A Week” ou “Tomorrow Never Knows”. Tirando o caso à parte do “Revolution 9”, pessoalmente acho este tema o mais fraco de todo o album.
1.B.7 – WHY DON’T YOU DO IT IN THE ROAD?
(Lennon/McCartney) 1:42
Mais um tema exclusivo de Paul, gravado a solo. Na discografia beatliana Paul sempre teve o epíteto do “melodioso”, em oposição a John que era considerado o “rocker”. Neste album existem algumas canções que parecem “trocadas”: esta e “Helter Skelter” são muito mais Lennon, enquanto que “Julia” ou “Good Night” soam mais a McCartney. Mas existia grande rivalidade entre os dois que adoravam surpreender-se mutuamente. “Why Don’t We Do It In The Road” teve mesmo o condão de irritar John que a apelidou de “very short, very rude, very rocking”. No íntimo estaria no entanto um pouco surpreendido que Paul tivesse composto algo no seu próprio estilo, como que lhe roubasse algo que por direito lhe pertenceria.
1.B.8 – I WILL (Lennon/McCartney) 1:46Não chega a dois minutos mas é mais um dos grandes momentos de inspiração de Paul. Foi a primeira canção dedicada a Linda Eastman, que na altura já substituíra de vez Jane Asher no coração de Paul. No dia 16 de Setembro, quando o tema foi gravado (apenas com o acompanhamento de Ringo) foram precisos 67 takes para que Paul se desse por satisfeito com o resultado obtido.
1.B.9 – JULIA (Lennon/McCartney) 2:57
O fecho da primeira metade do “White Album” não poderia ter sido mais pungente: uma simples e maravilhosa canção que John dedicou à memória da mãe, falecida dez anos antes na sequência de um atropelamento mortal. No entanto o seu amor por Yoko também se encontra presente, nas palavras “ocean child” (a tradução inglesa para yoko é “child of the ocean”), como que a confessar-lhe que, para além de amante, também desejava que ela ocupasse aquele lugar especial, vazio há tanto tempo. Yoko chegou a colaborar na letra da canção, a qual foi gravada por John sózinho em estúdio, apenas com uma guitarra acústica - os acordes foram muito influenciados pela maneira de tocar de Donovan (que em Rishikesh ensinou algumas dessas técnicas ao Beatle).
2.A.1 – BIRTHDAY (Lennon/McCartney) 2:40Trata-se do único tema do album que foi composto efectivamente a duo por Lennon e McCartney. O pretexto é que difere, conforme as fontes: umas dizem que foi um “presente” para Pattie, cujo aniversário ocorrera durante a estadia na India; mas outras, mais credíveis, afirmam que a canção foi já composta em Londres, nos próprios estúdios de Abbey Road, no dia 18 de Setembro, antecipando assim o 26º aniversário de Linda Eastman seis dias mais tarde (Paul sabia de antemão que ela estaria em Londres a tempo de festejar os anos com ele). Macca chegou esse dia mais cedo do que o costume aos estúdios e quando os outros apareceram, algumas horas depois, a música estava practicamente concluída. Nessa mesma tarde os Beatles foram a casa de Paul assistir pela televisão ao filme “The Girl can’t Help It” (1956) com Jayne Mansfield, e onde participavam diversos rockers: Fats Domino, Gene Vincent, Little Richard, Eddie Cochran e também os Platters. Inspirados por todos aqueles clássicos do Rock and Roll, os Beatles regressaram aos estúdios por volta das 11 da noite, escreveram o texto final e gravaram o tema. Yoko e Pattie participaram nos coros. Doze anos mais tarde, John Lennon diria sobre “Birthday”: «a good song to put in the trash».
2.A.2 – YER BLUES (Lennon/McCartney) 4:01Uma das canções “desesperadas” de John, que tentava a todo o custo mudar de vida e partir noutra direção com Yoko. Musicalmente o tema inspira-se nos blues ingleses, tão em voga nesse final dos anos 60 (John Mayall diria ser uma paródia aos verdadeiros blues). John faz ainda uma referência a “Ballad of a Thin Man” de Dylan através de “Mr. Jones”, o personagem um tanto ou quanto estúpido dessa canção.A gravação do tema reuniu de novo e apenas os instrumentos “clássicos” dos 4 Beatles: John na guitarra e vocais, Paul no baixo, George na guitarra e Ringo na bateria.
2.A.3 – MOTHER NATURE’S SON (Lennon/McCartney) 2:46Durante a estadia em Rishikesh, e na sequência de uma palestra dada pelo Maharishi sobre a relação do homem com a natureza, tanto Paul como John escreveram canções alusivas a esse tema. A de Paul foi esta, a escolhida para figurar no album branco. Uma vez mais gravou-a sózinho, sem a presença dos outros três. John chegou a gravar uma maqueta da sua canção (“A Child of Nature”) em Maio de 68, mas os Beatles não a chegaram a gravar. Em 1971 viria a ser incluída no album “Imagine” com o nome de “Jealous Guy”.
2.A.4 – EVERYBODY’S GOT SOMETHING TO HIDE EXCEPTME AND MY MONKEY (Lennon/McCartney) 2:25
John escreveu este tema em resposta a um desenho que teria aparecido numa revista qualquer em que Yoko era visualizada como um macaco empoleirado nos ombros de Lennon a cravar-lhe as unhas nas costas, como que a retira-lhe o talento. A réplica de Lennon foi incisiva, como de costume: «Não temos nada a esconder. Yoko inspira-me, não me destrói a habilidade de escrever boas canções». Grande pedaço de puro rock and roll, o tema começa com as palavras com que inicialmente se deveria ter chamado: “Come On, Come On”. Foi gravada num ritmo mais lento e depois ligeiramente “acelerada” para dar ainda mais ênfase ao som extraordinário das guitarras e da própria voz de Lennon.
2.A.5 – SEXY SADIE (Lennon/McCartney) 3:15
Os Beatles deixaram Rishikesh profundamente desiludidos com o Maharishi. Afinal o homem não passava de um vulgar oportunista que apenas desejava retirar benesses (monetárias e mesmo sexuais) do convívio com o grupo e restantes convidados. John compôs então esta “Sexy Sadie” como pseudónimo para o guru, já que não podia usar directamente o seu nome devido a eventuais sanções legais: “Sexy Sadie, what have you done? You made a fool of everyone...”
2.A.6 – HELTER SKELTER (Lennon/McCartney) 4:30O single “I Can See For Miles”, dos Who, saído em Outubro de 1967, teve uma crítica na revista Melody Maker onde se dizia, entre outras coisas, ser o tema de rock mais selvagem alguma vez feito. Paul leu essa crítica e nunca mais a esqueceu. Como os Beatles estavam sempre na vanguarda musical desses anos, Paul decidiu mostrar aos críticos o que a palavra “selvagem” significava realmente. E assim nasceu “Helter Skelter”, que rapidamente adquiriu o estatuto da música mais barulhenta de toda a discografia dos Beatles, quer a nível vocal (as vozes de Paul e de John explodem literalmente dos altifalantes) quer a nível instrumental (com as guitarras a percorrerem freneticamente toda a escala musical até o som se dissolver em feedbacks distorcidos). A gravação original durava, imagine-se, 25 minutos! Depois, claro, teve de ser encurtada para os 4 minutos e meio, finalizando com a exclamação do Ringo:
«I’ve Got Blisters On My Fingers!”Este foi mais um dos temas do album invocados por Charles Manson como incentivo à matança de Los Angeles. Inclusivé, o procurador geral encarregue dos homicídios, Vincent Bugliosi, publicou mais tarde um livro onde relatava todo o inquérito. Deu-lhe o nome de “Helter Skelter”.
2.A.7 – LONG, LONG, LONG (Harrison) 3:08
Depois da tempestade só poderia vir a bonança. O lado 3 do album branco termina com esta calma canção de Harrison. Inspirada em “Sad Eyed Lady Of The Lowlands” de Dylan (album “Blonde On Blonde”, de 1966), “Long, Long, Long” é uma simples canção de amor de alguém que recuperou o seu ente amado. George revelou no entanto não ter tido qualquer inspiração terrena mas apenas espiritual. O que não admira, tendo sido ele o Beatle que primeiro se interessou pela religião oriental.
2.B.1 – REVOLUTION 1 (Lennon/McCartney) 4:13E ao “Verão do Amor” de 67 seguiu-se a “Primavera da Revolução”. Em Março de 68 uma enorme manifestação teve lugar em Londres, frente à embaixada dos Estados Unidos, em Grosvenor Square, que terminou em violentos confrontos entre a polícia e os manifestantes. Dois meses depois foi o “Maio de 68” que eclodiu em Paris. John Lennon assistiu a todos esses acontecimentos pela televisão e resolveu também “participar”. Escreveu “Revolution” em casa, em Weybridge. Não era, longe disso, uma canção escrita por um revolucionário, apesar de Lennon ser o mais politizado dos Beatles e com ideias marcadamente de esquerda. Tratou-se antes de uma resposta de alguém a quem os grupos de jovens marxistas, leninistas ou trotskystas exigiam, constantemente, uma tomada de posição inequívoca. Para John a verdadeira revolução não passava pelos actos de violência de rua mas sim pela alteração das mentalidades.A 1ª versão que foi gravada foi esta, mais lenta, e onde aparece o verso “Don’t you know you can count me out...in”, como que existisse ainda uma hesitação no espírito de Lennon sobre o caminho a seguir. Já na 2ª versão, mais rápida, e editada no lado B de “Hey Jude”, o verso é expurgado das reticências finais. Foi o suficiente para que a revista Time, triunfantemente, consagrasse um artigo inteiro à canção, dizendo que ela “criticava todos os extremismos do mundo”. Seguiu-se uma série de correspondência entre Lennon e os autores do artigo sobre o tema “violência e revolução” que, evidentemente, originaram vendas astronómicas da revista. John gravou a canção deitado no chão, com o microfone pendurado sobre a boca. Mais uma vez a duração total da canção (cerca de 10 minutos) teve de ser encurtada para a sua inclusão no album.
2.B.2 – HONEY PIE (Lennon/McCartney) 2:42“... and now she’s hit the big time...”: Simples homenagem de Paul ao seu pai, Jim McCartney, e por extensão às músicas dos anos 20. A orquestração de George Martin é uma pequena maravilha, levando-nos a recuar no tempo, às grandes orquestras de salão.Incompreensivelmente foi mais um dos temas do album branco que Charles Manson pensou ser-lhe dedicada. Mas quem é que consegue compreender as razões de um louco?
2.B.3 – SAVOY TRUFFLE (Harrison) 2:55Quarta e última contribuição de George para o album, este tema não é mais do que uma alusão brincalhona à atração irresistível que Eric Clapton sentia por chocolates, a ponto disso lhe ter dado cabo dos dentes. Na letra aparecem referências a diferentes tipos de chocolate Good News, da Mackintosh: Creme Tangerine, Montelimart, Ginger Sling, e Coffee Dessert, além do próprio Savoy Truffle. Mas por exemplo Cherry Cream e Coconut Fudge foram inventados por George por necessidades de construção da canção.
2.B.4 – CRY BABY CRY (Lennon/McCartney) 2:34
John inspirou-se num anúncio publicitário que viu na televisão (“Cry baby cry, make your mother buy”) para compor esta canção, mas a música denota grande influência das canções que Donovan costumava escrever para crianças. A canção termina com uma pequena intervenção de Paul (“Can You Tack Me Back Where I Came From”), que serve de ligação ao tema seguinte.
2.B.5 – REVOLUTION 9 (Lennon/McCartney) 8:15Há quem considere este tema o pior de toda a discografia dos Beatles. Não concordo. Primeiro porque não é um tema propriamente dito, depois porque nem sequer pode ser considerado pertencente aos Beatles. Trata-se, isso sim, de uma colagem de sons feita por John e Yoko que, já completamente inseparáveis, tentavam mostrar ao mundo todo o seu vanguardismo artístico. Recorreram aos arquivos da EMI, donde extrairam grande parte dos sons que aparecem na faixa, e cujas proveniências eram quase impossível de identificar, como por exemplo a voz de “number nine..., number nine...number nine…”. Mesmo assim ainda se conseguem ouvir algumas palavras ditas por John, Yoko, George ou Ringo. McCartney encontrava-se nos Estados Unidos quando o tema foi gravado e ficou furioso quando o mesmo foi incluido no album por decisão dos outros três Beatles.
2.B.6 – GOOD NIGHT (Lennon/McCartney) 3:14“Good Night” é certamente o tema mais sentimental escrito por Lennon. Fê-lo como que uma canção de embalar para Julian, tal como doze anos depois escreveu “Beautiful Boy” para Sean. Pouco depois acontecia o divórcio de Cynthia é só muitos anos depois é que Julian soube que a canção lhe era dedicada. Tratando-se de um album duplo, e como a voz de Ringo tinha de aparecer também neste segundo disco, Lennon trauteou-lhe a canção para lhe mostrar como queria que ela soasse. Ringo cantou-a admiravelmente, acompanhado por uma orquestra de trinta elementos, incluindo harpa e coros.
Cerca de 94 minutos depois de um avião a jacto ter aterrado no prato do nosso gira-discos, “Good Night” mandava-nos a todos para a caminha ter belos sonhos…